Oi, pessoal! Tudo bem com vocês? Estou fazendo um curso profissionalizante de teatro lá no ETA (Estúdio de Treinamento Artístico) e hoje vou compartilhar a incrível experiência que tive. Para a conclusão do módulo 1 nossa tarefa foi realizar um trabalho coletivo: A criação e encenação de uma peça de teatro. Não foi nada fácil, mas o resultado final foi incrível. Nesse post vou focar especificamente sobre a dramaturgia, mas farei um outro texto sobre outros aspéctos do processo de criação coletiva.
Após muita discussão e tumulto chagamos ao ponto, quer dizer à peça “O Ponto”, me perdoe o trocadilho infame, um verdadeiro manifesto político, que aborda a invisibilidade social e nos faz refletir sobre como tantas pessoas são negligenciadas e esquecidas em nossa sociedade. Tema muito perinente para os dias de hoje em que vivemos em nossas bolhas sociais alienantes.
A história de “O Ponto” gira em torno de Juvenal, um jovem cheio de sonhos e esperanças que decide deixar sua cidade natal, Água Viva, no interior de Minas Gerais, e buscar uma vida melhor em São Paulo (a cidade de Áqua Viva pertence ao município de Estrela Dalva no interior de Minas Gerais e foi escolhida por sugestão – e em homenagem – a nossa querida professora/mediadora/diretora Paula Lopes)

O rapaz acredita que na cidade grande, lugar que Caetano Veloso chamou na música Sampa de “o avesso do avesso do avesso do avesso”, encontrará melhores oportunidades para juntar algum dinheiro, voltar para sua terra natal e ajudar sua querida mãezinha. Entretanto, ao chegar na Selva de Pedra, ele é assaltado, desencadeando uma sequência de eventos infelizes que o levam a se tornar um morador de rua.
Ele encontra um abrigo improvisado num ponto de ônibus, que acaba se tornando seu novo lar. Ali enfrenta a dura realidade da vida nas ruas, lutando contra a fome, o frio e a indiferença das pessoas que passam por ele diariamente. É nesse contexto que o título da peça, “O Ponto”, ganha significado (figurado e literal).
Uma das cenas mais impactantes é um curto monólogo que Juvenal faz quase no final segundo ato. Subindo no banco do ponto, olha para as pessoas ao redor e declara com firmeza: “Oi, pessoal! Eu tô aqui! Não sou invisível! Não finjam que não estão me vendo!”. Esse momento poderoso revela a luta de Juvenal para reivindicar sua existência, para ser enxergado e ter sua humanidade reconhecida.
Parabéns pra você...
Outro destaque marcante da peça é quando Juvenal percebe que é seu aniversário. Mesmo em sua condição precária, vasculha o lixo em busca de algo para comer e improvisa um bolo. Com determinação e uma pitada de tristeza, ele reúne restos de comida e os arranja de forma improvisada, na esperança de cantar “Parabéns” para si mesmo, solitariamente no ponto de ônibus.
Juvenal finge acender uma vela e a coloca sobre sua “obra-prima” feita com os “recursos disponíveis”. Emocionado, começa a cantar para si mesmo. Sua voz ecoa no vazio, revelando sua força para tentar encontrar alguma alegria na dura circunstâncias em que se encontra, mas sua tentativa é em vão. Pessoas da platéia confessaram ter derrubado algumas lágrimas nesse momento.
Essa cena é profundamente comovente e nos faz refletir sobre a solidão e a resiliência de pessoas como Juvenal, que batalham diariamente para encontrar um pouco de esperança e felicidade, mesmo em situações adversas. Ela nos leva a repensar nossas próprias vidas e a valorizar as pequenas coisas que frequentemente passam despercebidas.

O final da peça é um ato político à parte, após a última cena com Juvenal morto no palco, a cortina se fecha por um breve momento e quando abre novamente todos os atores estão posicionados aleatoriamente pelo palco. Alguns têm fita adesiva cobrindo a boca, outros estão com fones de ouvido e há também alguns com vendas nos olhos, essa cena simboliza a indiferença das pessoas em relação aos invisíveis de nossa sociedade. Representa também a alienação que muitas vezes vivemos por conta das redes sociais, simboliza os impedimentos que enfrentamos para enxergar a realidade. É uma metáfora poderosa das barreiras que nos separam e da falta de empatia que muitas vezes permeia nossa sociedade.
Enquanto os atores estão no palco um áudio é reproduzido com depoimentos de pessoas como o Juvenal, que por motívos distintos foram se tornando invisíveis nas ruas dessa cidade gigante e fria. Aos poucos os atores vão saindo até que não resta mais ninguém para ouvir os lamentos dessas pessoas. E fim.
A peça peça, nos confronta com a realidade de que Juvenal é apenas uma representação de tantas pessoas invisíveis em nossas cidades, cujas histórias merecem ser ouvidas e cuja humanidade não pode ser ignorada. “O Ponto” nos leva a refletir, a nos emocionar e, espero, a agir em prol de uma sociedade mais justa, onde ninguém seja deixado para trás.”O Ponto” é uma peça que nos mostra o quanto julgamos as pessoas ao nosso redor sem realmente conhecê-las e convida a enxergar além das aparências, das nossas crenças, valores e preconceitos, nos convida a estender a mão e a compreender a complexidade das vidas que estão à margem da sociedade. Tão longe e tão perto de nós. Ela nos faz questionar nossa própria responsabilidade em relação à invisibilidade social e nos incentiva a agir para promover mudanças e construir uma sociedade mais inclusiva e acolhedora.
E para angústia de todos, assim como em muitos casos da vida real, o mocinho morre no final. E ponto.
Hahahaha amei, que venha muito mais!!
Que venham muito mais meu querido!
Adorei! Ótima resenha da peça. Parabéns pela conclusão do módulo!